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22 DE SETEMBRO – UM CONVITE À REFLEXÃO SOBRE MOBILIDADE E DESIGUALDADE

Por Instituto Corrida Amiga

Desde que os carros chegaram às ruas (final do século XIX e início do século XX), mataram mais de 60 milhões de pessoas — uma em cada 34 mortes no planeta é causada pela automobilidade — e feriram pelo menos 2 bilhões em todo o mundo. O uso excessivo dos carros intensifica as desigualdades sociais e danifica ecossistemas. Isso ocorre em uma realidade onde apenas 16 em cada 100 habitantes do planeta têm carros, mas todos sofrem os problemas gerados por esse meio de transporte, especialmente as populações mais vulneráveis: pessoas pobres, negras e indígenas (Miner et al., 2024).

Na década de 1990, ações de “Dias Sem Carro”, impulsionadas pela crescente consciência sobre sustentabilidade e impacto ambiental da mobilidade urbana, começaram a se espalhar pelo mundo. Essas discussões permanecem tão relevantes que várias cidades ampliaram os eventos para o mês inteiro, transformando setembro no mês da mobilidade. O Dia Mundial Sem Carro chegou ao Brasil no início dos anos 2000, como parte deste movimento global por cidades mais sustentáveis. Mais do que simplesmente “deixar o carro em casa”, o objetivo é discutir o direito à cidade e ressaltar a prioridade dos modos ativos de transporte — prioridade já conquistada em marco legal, mas que precisa urgentemente ser implementada “no chão das ruas”. É importante notar que 70% dos domicílios formados apenas por pessoas negras não possuem automóveis (Pereira, 2021). Portanto, discutir uma cidade livre de automóveis implica abordar a restrição de privilégios predominantemente associados à população que constitui o principal grupo detentor de veículos particulares (Pereira; Trói; 2022)  

Essa desigualdade também é evidente na cidade de São Paulo, como revela o Mapa da Desigualdade 2022. O estudo mostra que as periferias, predominantemente negras e jovens, são as mais impactadas pelo crescimento urbano e o modelo carrocêntrico. É importante ressaltar que essas populações dependem de um transporte público de baixa qualidade, devido à falta de investimentos, e enfrentam barreiras econômicas e acesso limitado à infraestrutura e serviços essenciais, como saúde, educação e lazer. Além disso, elas convivem com os efeitos negativos da expansão carrocêntrica, como poluição, ruído e aumento de sinistros de trânsito. A priorização dos carros agrava as desigualdades e reforça o racismo estrutural, pois restringe o acesso a oportunidades e expõe a população periférica a crises e desastres ambientais.

Mobilidade Ativa

Todas as formas de transporte movidas pela energia e vida dos corpos! A Mobilidade Ativa abraça a inclusão, promove a saúde, economiza recursos e minimiza o impacto ambiental. No entanto, apesar de seus benefícios, ainda são frequentemente negligenciados: as condições adversas da infraestrutura urbana e dos serviços públicos tornam o ato de caminhar e pedalar desafios diários, muitas vezes inseguros e inacessíveis.

Para muitos, caminhar ou pedalar não são escolhas, mas necessidades impostas pela falta de alternativas, seja pela ausência de um transporte público eficaz ou pela escassez de recursos para pagar uma passagem. A integração entre mobilidade ativa e transporte público coletivo é essencial para a construção de cidades sustentáveis e inclusivas, sendo um caminho para reverter a lógica atual.

O Instituto Corrida Amiga apresenta a exposição ‘Mobilidade Ativa: conectando pessoas e espaços’ na Unibes Cultural, durante os meses de setembro e outubro de 2024. A mostra convida o público a refletir sobre a vivência da cidade por meio dos corpos em movimento, com fotos e vídeos que resultam da aplicação de nossas metodologias lúdico-educativas e do olhar sensível de fotógrafos colaboradores, além de dados de pesquisas relevantes. A exposição está dividida nas seguintes seções: Saúde; Acessibilidade; Infância; Cultura; Sustentabilidade; Pessoa Idosa (60+); Transporte Público coletivo. Além disso, prestamos homenagem à ciclista Marina Kohler Harkot, vítima de atropelamento enquanto pedalava, e celebramos seu legado na promoção da mobilidade ativa.

Mobilidade e Saúde

Você está cuidando da sua saúde? Caminhar regularmente reduz o risco de doenças crônicas como hipertensão, diabetes e doenças cardíacas. A Organização Mundial da Saúde recomenda pelo menos 150 minutos de atividade física moderada por semana. A caminhada diária pode melhorar o humor, reduzir sintomas de depressão e ansiedade, e aumentar o bem-estar geral. Estudos mostram que a prática regular de caminhadas está associada a uma redução significativa na mortalidade precoce. Caminhar regularmente traz inúmeros benefícios à saúde. Caminhar pelo menos 4 mil passos por dia pode reduzir o risco de morte por qualquer causa (Banach, 2023). Além disso, através da caminhada você pode se integrar ainda mais com o ambiente e a sociedade. Que tal incluir ao menos 30 minutos de caminhada nos seus deslocamentos diários? Convide amigos e explorem a cidade juntos!

Mobilidade e Acessibilidade

O Brasil tem cerca de 18,9 milhões de pessoas com deficiência (IBGE, 2022). A acessibilidade universal é essencial para garantir que essas pessoas, idosos e outras populações vulneráveis se desloquem de forma independente e segura. Contudo, a falta de calçadas e rampas adequadas em muitas cidades brasileiras limita a mobilidade dessas pessoas, comprometendo sua participação social. Apesar de a Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/2015) garantir a acessibilidade, apenas 69% das calçadas nos domicílios possuem pavimentação, e apenas 4,7% são acessíveis (IBGE, 2010).

A acessibilidade beneficia não só pessoas com deficiência, mas também idosos, mães com carrinhos de bebê e outros. A falta de calçadas adequadas força muitos pedestres a utilizarem a rua ou ciclovias, o que aumenta os riscos. O Plano de Monitoramento de Viagens em Bicicleta para São Paulo (2023) demonstra que quando temos infraestrutura cicloviária a presença de mulheres aumenta em 8,5% e reduz o uso de calçadas em 4,1%. Sem ciclovias, a presença feminina cai 4,8% e o uso de calçadas sobe para 33,9% (Ciclocidade, 2023). Cidadãos utilizam a infraestrutura onde se sentem mais seguros, mesmo com riscos adicionais. Priorizar a mobilidade ativa torna as cidades mais acessíveis e inclusivas.

Mobilidade e Infância

Uma cidade para crianças é uma cidade boa para todas as pessoas!

A criança tem direito a uma cidade segura, instigante, que ofereça oportunidades de um desenvolvimento espacial e social, acolhedor e edificante. Incentivar a mobilidade ativa em crianças e adolescentes promove a prática regular de atividade física, melhora a concentração, fortalece a relação com o espaço público, desenvolvendo noções de cidadania, e contribui para a preservação do meio ambiente ao reduzir a emissão de poluentes. Esses benefícios ajudam no desenvolvimento físico, cognitivo, social e ambiental de crianças e jovens.

Mobilidade e Cultura

Quando as pessoas caminham ou pedalam, elas não só melhoram sua saúde e reduzem seu impacto ambiental, mas também vivenciam e fortalecem a cultura local, tornando a cidade um lugar mais vibrante e inclusivo. Atividades culturais incentivam a mobilidade ativa, promovendo maior interação com o ambiente urbano, contato com o patrimônio e fortalecendo o sentido de pertencimento e identidade cultural. Uma infraestrutura adequada para pedestres e ciclistas facilita o acesso à cultura, promovendo a igualdade social e a sustentabilidade urbana. Investir em mobilidade ativa é, portanto, uma estratégia crucial para garantir que todos os cidadãos possam participar plenamente da vida cultural de suas comunidades, promovendo cidades mais justas e sustentáveis.

Mobilidade e Sustentabilidade

Caminhar é uma das formas mais sustentáveis de transporte, pois reduz significativamente a emissão de gases de efeito estufa e poluentes locais.  A promoção da mobilidade ativa está alinhada com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), especialmente o ODS 11, que busca tornar as cidades mais inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis. O setor de transportes é responsável por 44% das emissões de CO2 nas cidades brasileiras (ANÁLISE, 2023). Priorizar a mobilidade ativa e o transporte público pode reduzir significativamente essas emissões. A meta 11.2 do ODS 11 visa garantir acesso a sistemas de transporte seguros e sustentáveis para todos até 2030, reforçando a importância de investir em alternativas que promovam a mobilidade ativa e reduzam o impacto ambiental.

Mobilidade e Pessoa Idosa (60+)

Cidades caminháveis são particularmente importantes para pessoas idosas, com deficiência e/ou mobilidade reduzida, garantindo-lhes acesso seguro à cidade, autonomia para ir e vir, boa saúde, física e psicológica, e plena participação na sociedade. Com o envelhecimento da população brasileira, a mobilidade ativa torna-se ainda mais relevante. Segundo o IBGE (2018), em 2060, um em cada quatro brasileiros terá mais de 65 anos. A Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) garante a priorização do atendimento ao idoso por sua família e pelo serviço público, incluindo a adequação dos espaços públicos para a mobilidade segura dessa população.

Mobilidade a Pé e Conexão com Transporte Público Coletivo

Integrar a caminhada com o uso de transporte público é fundamental para a redução do uso de automóveis, especialmente em trajetos curtos. Cidades bem planejadas oferecem infraestrutura que conecta pedestres a pontos de transporte público de maneira eficiente e segura. Outro importante benefício da mobilidade ativa associada ao transporte público coletivo é o incentivo à prática de atividades físicas. Pessoas que utilizam o transporte público, a bicicleta ou a caminhada como principal meio de locomoção fazem mais exercícios físicos do que os usuários de transporte individual motorizado, o que contribui para uma rotina mais ativa e, consequentemente, para a saúde individual, podendo salvar vidas que são perdidas devido à inatividade física (IUTP, 2016). Os usuários do transporte coletivo também são pedestres, já que toda viagem começa e termina a pé. Por isso, garantir rotas caminháveis aos pontos ou estações de transporte público coletivo é fundamental para promover o acesso equitativo. Assim como os ciclistas também devem ter seu acesso garantido ao transporte público coletivo. Portanto, integrar mobilidade a pé, ciclomobilidade e transporte coletivo é o caminho para inverter a lógica existente. A integração entre mobilidade a pé e transporte público é essencial para cidades sustentáveis.

Marina Kohler Harkot

Uma cidade boa para pedestres e ciclistas, é boa para todas as pessoas! 

Já era quase meia noite de 7 de novembro de 2020, quando Marina se despediu das amigas, pegou sua bicicleta e foi embora – mas não chegou em casa. Sua vida foi tragicamente interrompida na Av. Paulo VI, em São Paulo, por um motorista embriagado que fugiu sem prestar socorro. 

A bicicleta era uma paixão, um meio de transporte e uma causa para Marina. Socióloga, doutoranda e pesquisadora, ela atuava em espaços de ativismo e articulações pelo direito à cidade.

A sociedade civil precisa se mobilizar em torno do tema, para fazer com que o Poder Judiciário atue firmemente sobre este e outros crimes de trânsito. Saiba mais do movimento “pedale como Marina” em  https://pedalecomomarina.org/

Chamado

O Dia Mundial Sem Carro nos convida a refletir sobre como estamos ocupando as nossas cidades e qual é o impacto da cultura do automóvel em nossas vidas. É um chamado para repensar as escolhas que fazemos no dia a dia e pressionar o poder público por políticas e soluções que favoreçam a mobilidade sustentável, inclusiva e segura. O Instituto Corrida Amiga, desde 2014, busca aproximar e conectar as pessoas ao espaço em que vivem, com atividades de sensibilização lúdico-educacionais, desenvolvimento de projetos, pesquisas e manuais voltados às crianças, jovens, adultos, idosos e pessoas com deficiência e que já beneficiou mais de 26 mil pessoas na região metropolitana de São Paulo. Para isso, contamos com um programa de voluntariado que atua em atividades presenciais e online!

 

Fontes:

Banach, Maciej et al. The association between daily step count and all-cause and cardiovascular mortality: a meta-analysis, European Journal of Preventive Cardiology, Volume 30, 18, dez. 2023, Páginas 1975–1985, https://doi.org/10.1093/eurjpc/zwad229.

CICLOCIDADE, Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo. Plano de monitoramento de viagens em bicicleta para a cidade de São Paulo. São Paulo: Ciclocidade, 2023.

IUTP. Policy Brief: Desvendando os benefícios da mobilidade para a saúde. São Paulo, IUTP, 2016.

Miner, P., et al. Car harm: A global review of automobility’s harm to people and the environment. Journal of Transport Geography, v.115, February, 2024.

Pereira, G. Posse de veículos por raça no Brasil. Journal of Sustainable Urban Mobility, 1(1-2), 2021.

Pereira, G.; de Trói, M. Viver sem os carros é possível? LinkedIn, 2022. (Multiplicidade Mobilidade Urbana)

ANÁLISE das emissões de gases de efeito estufa e suas implicações para as metas climáticas do Brasil 1970-2022, SEEG, 2023. Disponível em: https://seeg.eco.br/wp-content/uploads/2024/02/SEEG11-RELATORIO-ANALITICO.pdf

 

 

 

Pensando a educação sobre o Holocausto no século XXI

Por Carlos Reiss*

Qualquer iniciativa de transmissão que envolva o genocídio cometido pelos nazistas e seus colaboradores, ocorrido tanto no prelúdio quanto no âmbito da Segunda Guerra Mundial, precisa partir, invariavelmente, de duas premissas. A primeira delas é um pressuposto humanista transformado em lema pela Ciência e que passou a ser conhecido como Pedagogia do Holocausto.

Da frase de abertura de uma palestra realizada em 1965 pelo filósofo alemão Theodor Adorno emergiu a famosa máxima em tom imperativo de que “a exigência que Auschwitz não se repita é a primeira de todas para a educação”. Seu argumento de que seria estéril qualquer iniciativa no campo educacional que não fosse realizada com as atenções voltadas aos reflexos da barbárie nazista faz parte de uma concepção além de seu tempo: em primeiro lugar, de que a educação precisa voltar-se ao fundamento aristotélico de que o homem é um ser social; em segundo, pelo anseio por uma educação construída essencialmente para a ação.

Com esta frase aparentemente descomplicada, Adorno ressalta que a educação seria a única razão objetiva que resta à humanidade: mais do que evitar que a tragédia se repita de outras formas, para construir um presente e um futuro pautados pela tolerância e pela pluralidade, centrados no zelo absoluto aos direitos humanos.

De Adorno passamos a Bauman, autor da segunda premissa. Ao impressionar-se com o volume de evidências reunidas pelos historiadores, o sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman afirmou que “o Holocausto era uma janela, e não uma imagem na parede. Olhando através dessa janela, pode-se vislumbrar muitas coisas invisíveis”. Uma das chaves para esta perspectiva é o questionamento sobre tudo que se mantém invisível, despercebido do ponto de vista pedagógico, enquanto não enxergamos os conteúdos e os fatos históricos “do outro lado da “janela”. Ao falar sobre “janela”, refletimos sobre oportunidades (de atravessá-la). Nela, estão as possibilidades, praticamente infinitas, de alcançarmos quaisquer objetivos educativos e atingirmos, enfim, a premissa pautada por Adorno.

Até meados da última década, infelizmente, os pensamentos de Adorno e de Bauman não costumavam ser explorados, em toda a sua magnitude, pela educação brasileira. O Holocausto normalmente figurava no rodapé dos livros da educação básica. Com a polarização e a vulgarização da Shoá por parte de governantes, jornalistas e influenciadores, o tema tomou um caminho oposto. De modo geral, a educação brasileira tem dificuldades em lidar com as lições que o Holocausto pode nos proporcionar. A tragédia ainda era vista como um recorte da História conectado exclusivamente à guerra e desvinculado de nossas mazelas contemporâneas. Faltava dar sentido a estas histórias, descartando seu viés conteudista e massificado.

No campo educacional ligado à Shoá, nenhum exemplo materializa tão bem esses fundamentos de Adorno e de Bauman quanto o fenômeno de “O Diário de Anne Frank”. Mais do que ajudar no processo de construção da memória coletiva universal do Holocausto por meio da personificação das vítimas, elemento incomum até meados dos anos 1970, o relato genuíno e sincero de uma adolescente judia que, mesmo em meio a um contexto extremo, continuou escrevendo de maneira tão apaixonada, funciona como um catalisador para essa educação. E por isso é tão fácil se identificar com Anne Frank.

Por gerações, os jovens que leem o diário (e consomem seus subprodutos literários e audiovisuais) reconhecem sua voz, sua maturidade, seus pensamentos e seus desejos íntimos. Problemas, medos, dúvidas e planos são inerentes a qualquer pessoa – o que torna o texto desse gênero literário um instrumento esplêndido de construção de empatia e desenvolvimento da alteridade a partir de um contexto traumático que envolve o ódio e a intolerância.

No entanto, a existência do diário por si só não significa uma construção automática do conhecimento, mas sobretudo um esforço para que ele atinja crianças e jovens em espaços educativos. Se concordamos que as premissas de Adorno e de Bauman já estão bem fundamentadas e compreendidas (e nem sempre estão), e que possuímos em mãos uma ferramenta literária com potencial extraordinário como o texto de “O Diário de Anne Frank”, cabe aos educadores a complexa tarefa de sistematização e elaboração de perspectivas teóricas e de pontes metodológicas.

Nesse caso, o trabalho árduo de produzir sentido e decodificar o conteúdo, mesmo com os grandes riscos e dilemas pedagógicos envolvidos no processo, possibilita se dedicar com que o historiador alemão Bodo von Borries chama de Burdening History (histórias difíceis, tensas ou pesadas). Sua concepção, transformada em referencial teórico, aponta que “a História só é aprendida de forma eficaz sob três condições dadas: se novas perspectivas podem ser ligadas com as antigas, se ela estiver conectada a emoções – negativas ou positivas – e se é relevante na vida”.

A exposição “Anne Frank: deixem-nos ser”, em cartaz na Unibes Cultural e idealizada pela Associação Inspirar-te, concretiza todos esses esforços educativos de maneira lúcida e coerente. Ela materializa o princípio do “nunca mais” por meio de conexões contemporâneas por meio da arte e de ações diretas. Quando falamos “nunca mais”, estamos nos comprometendo a tornar a memória o que toda memória deve ser: útil. Estamos imbuídos de, sim, manusear a memória do Holocausto e utilizá-la como agente transformador, sem vulgarizá-la – e esse é um dos pressupostos do universalismo da Shoá ligado à educação sobre os direitos humanos. E nada melhor do que o legado de Anne Frank para renovarmos nosso pacto coletivo de que vamos identificar os sinais e lutar contra toda e qualquer forma de ódio, intolerância e discriminação, contra qualquer grupo, principalmente as que estão próximas de nós.

* Carlos Reiss é coordenador-Geral do Museu do Holocausto de Curitiba. Membro do comitê executivo da Rede Latino-Americana para o Ensino da Shoá (LAES), da delegação brasileira da International Holocaust Remembrance Alliance (IHRA) e da equipe curatorial do Memorial às Vítimas do Holocausto do Rio de Janeiro. Curador-chefe da exposição “Anne Frank: deixem-nos ser” e autor dos livros “Luz sobre o Caos: Educação e Memória do Holocausto” e “Entre as sombras e os sóis: a história de Sala Borowiak”.

Referências:

ADORNO, Theodor W. Educação após Auschwitz. In: Educação e Emancipação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. p. 119-138.

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e Holocausto. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998.

BORRIES, Bodo von. Jovens e Consciência histórica. In: Bodo von Borries: organização e tradução de Maria Auxiliadora Schmidt, Marcelo Fronza, Lucas Pydd Nechi. Curitiba: W. A. Editores, 2018.