
Por Stella Kochen Susskind
Pioneira do Cliente Oculto na América Latina e CEO da Shop&Test
Em 13 de novembro comemora-se o Dia Mundial da Gentileza, uma data que, à primeira vista, parece singela — mas carrega em si um manifesto de civilidade. Em tempos de pressa e hipervelocidade, ser gentil se tornou um ato quase revolucionário. E talvez por isso, neste ano, a data mereça mais do que um post ou uma hashtag: ela pede reflexão sobre como tratamos o outro, dentro e fora das empresas.
Um movimento global com alma brasileira
O World Kindness Movement, fundado em Tóquio em 1996, deu origem à celebração que hoje é reconhecida em mais de 30 países. A ideia é simples e poderosa: promover gestos espontâneos de bondade e compaixão, sem esperar nada em troca.
No Brasil, a data ganhou contornos poéticos graças ao lendário José Datrino, o Profeta Gentileza, que nas décadas de 1980 e 1990 espalhou suas frases pelos viadutos do Rio de Janeiro. “Gentileza gera gentileza” tornou-se um mantra nacional — e um lembrete de que a cortesia é mais do que comportamento: é cultura.
Essa herança simbólica tem tudo a ver com o universo do Cliente Oculto, onde observo, há mais de três décadas, o poder transformador de um gesto simples no atendimento. Em um mundo obcecado por indicadores e metas, o ato de olhar o cliente nos olhos e tratá-lo com respeito genuíno ainda é o maior diferencial competitivo.
O que a gentileza revela nas jornadas de atendimento
Em uma visita recente, um atendente de uma rede de varejo me surpreendeu com algo fora do script. Depois de responder todas as minhas perguntas, ele disse:
“Posso te ajudar a comparar opções para que você leve o que realmente faz mais sentido para o seu uso?”
Não era uma frase decorada. Era empatia real — e isso muda tudo.
Em outra ocasião, sentada em um café, um garçom percebeu que meu celular vibrava à mesa enquanto ele tirava meu pedido e disse, em tom baixo:
“Pode atender, sem problema. Eu volto depois.”
Nenhum treinamento ensina esse tipo de sensibilidade. São pequenos gestos, quase imperceptíveis, mas que revelam algo essencial: gentileza é percepção emocional em ação.
Quando falamos de experiência do cliente, falamos de vínculos humanos. Um sorriso, um cuidado extra, uma escuta atenta — são elementos intangíveis que criam memória afetiva. E é justamente aí que entra a metodologia do Cliente Oculto: ela permite mensurar o que parece imensurável.
Em cada avaliação que conduzimos , procuro reforçar que, por trás de toda métrica, há uma emoção. E é essa emoção que constrói fidelidade. E nos desvendamos o emocional com razão.
Gentileza: dados que confirmam o sentimento
Um levantamento conduzido pela Mental Health Foundation do Reino Unido mostrou que 63% das pessoas relataram melhora significativa no bem-estar ao praticar ou receber atos de gentileza. A ciência confirma o que a intuição já sabia: ser gentil reduz o estresse, fortalece laços sociais e melhora até o desempenho cognitivo.
Estudo publicado pelo The Guardian apontou ainda que, após a pandemia, o que os pesquisadores chamaram de “benevolence bump” — um aumento global nos comportamentos altruístas — persiste até hoje, com níveis de gentileza 10% maiores do que antes de 2020.
Não é coincidência. A crise sanitária mundial nos lembrou, da forma mais dura, que o humano é frágil. E a gentileza, ao contrário do que muitos pensam, não é sinônimo de fraqueza — é uma forma sofisticada de inteligência emocional.
Gentileza como métrica de excelência
Quando pensamos em experiências de consumo, o discurso corporativo costuma se concentrar em “agilidade”, “eficiência”, “resolução”. Mas a verdadeira excelência de atendimento passa por algo que raramente entra nos dashboards e gráficos: a percepção de cuidado.
Em programas de Cliente Oculto, incluir indicadores de empatia — como “o cliente se sentiu acolhido?” ou “houve personalização na interação?” — é uma maneira concreta de trazer humanidade para as métricas.
Tenho defendido isso em conferências e apresentações: gentileza é o novo KPI invisível. Ela não aparece em relatórios de produtividade, mas aparece na memória do consumidor. E, como sabemos, marcas não são lembradas apenas pelo que vendem, mas por como fazem o cliente se sentir. E isso se aplica a todos os segmentos e todos os canais. Vivemos a era omnichannel ( online, offline , etc) onde o atendimento físico e digital se falam, daí surgiu o universo Phygital.
Uma agenda para o futuro
Mais do que uma data, o 13 de novembro é um lembrete de que a gentileza é uma estratégia de longo prazo em todos os segmentos— no varejo, na hospitalidade, nas finanças, centros culturais , serviços dos mais variados, revendas de automóveis entre centenas de sub segmentos.
Empresas que cultivam ambientes gentis têm colaboradores mais engajados e clientes mais leais. Gentileza, afinal, é contagiante.
Talvez o desafio contemporâneo seja reaprender o óbvio: falar “bom dia” com intenção, agradecer com sinceridade, ouvir sem interromper, cuidar dos detalhes. Pequenas ações, grandes impactos.
Como pioneira do Cliente Oculto na América Latina, posso afirmar: nenhuma tecnologia substitui o calor humano de uma boa interação. O futuro do consumo será cada vez mais digital — mas o encantamento continuará sendo profundamente humano.
E, como dizia o Profeta Gentileza, “gentileza gera gentileza”. No atendimento, nas empresas e na vida.”




