Por Carolina Mestriner

O dia 17 de maio de 1990 não foi um dia comum para uma parte importante da população mundial, formada por pessoas lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. O século 20 estava perto do fim quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) retirou a homossexualidade da classificação estatística internacional de doenças e problemas relacionados à saúde. Se você faz parte das novas gerações, talvez seja até difícil de acreditar porque hoje a aversão ao homossexualismo é um crime inafiançável e imprescritível no Brasil desde 2019. 

A data tornou-se então o dia oficial da luta contra a homofobia em todo o mundo, e vamos aproveitá-la para falar de algo muito importante se desenvolvendo no contexto brasileiro: o movimento LGBTI+ indígena. O novo Censo do IBGE 2022 revelou um aumento de brasileiros que se autodeclaram indígenas, chegando ao número preliminar de 1,6 milhão de pessoas. Esse crescimento se reflete em diversas dimensões da vida, pois há diversidade de etnias, de culturas, de línguas e também sexual e de gênero entre os povos originários. A luta por esse reconhecimento acontece dentro e fora das comunidades indígenas e é travada por seus próprios integrantes. 

Uma das representantes mais atuantes do movimento LGBTI+ indígena é Yakecan Potyguara, uma jovem atriz e ativista indígena da aldeia de São José, na cidade de Crateús, Ceará. Educadora, palestrante, lésbica e cofundadora do Coletivo Caboclas Indígenas LGBTI+. Também participa de movimentos sociais, como o MST, Levante da Juventude e Via Campesina LGBTI. Yakecan milita pelo empoderamento, protagonismo e pela visibilidade dos indígenas nas questões de gênero, sexualidade e identidade, entre outras ações de cunho sociopolítico. Tem utilizado o audiovisual como linguagem e ferramenta nessas batalhas, com três curtas na bagagem e outro em andamento. Também está no curso de Agropecuária do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE) e trabalhando na organização do 1º Seminário LGBTI+ Indígena Sertão de Crateús, sob o tema: Diversidade e Identidade de Gênero. 

O Coletivo Caboclas na qual Yakecan atua é formado por 15 mulheres de diferentes territórios, mas com uma pauta comum: a luta por voz e visibilidade para indígenas LGBTI+. Junto com o Coletivo Tybyra, conquistaram uma vitória importante no dia 19 de abril, quando viram protocolado o projeto de lei que propõe a inclusão de Tibira do Maranhão, considerado  a primeira vítima de homofobia no Brasil ao ser morto em 1614 por um tiro de canhão, no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria. 

A luta contra a homofobia está entrelaçada às pautas de defesa da diversidade, de combate ao preconceito e à discriminação, seja de cor, de etnia ou de orientação sexual. Por isso a importância e relevância de grupos defendendo e discutindo a diversidade entre as populações indígenas. Recentemente, Yakecan foi umas das lideranças a participar da segunda plenária sobre a temática “INDÍGENA LGBT+” durante a 19ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL), que aconteceu entre 24 e 28 de abril deste ano. Durante 5 dias, cerca de seis mil indígenas e 200 povos estiveram acampados na Praça da Cidadania, em Brasília, na maior Assembleia dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil. A realização de uma plenária sobre esse tema representa mais um avanço na luta contra a homofobia.  

Yakecan conta que atualmente o coletivo está dando uma oficina de audiovisual para os curumins da aldeia São José, onde mora, e organizando um seminário que acontecerá em junho, com a participação de mais de 200 indígenas LGBTI+ de todo o país, um sonho idealizado desde 2019, que ainda precisa de apoio e muito trabalho para concretizar-se. E convida: são todes bem-vindes! 

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